Glossário - Critérios de Autoria

A atribuição de autoria em pesquisas científicas é fundamental no mundo acadêmico, influenciando a reputação dos pesquisadores. Este artigo explora os desafios, critérios e soluções, incluindo o papel do ICMJE e do CRediT, destacando a importância desse aspecto para a integridade acadêmica.

 

Atribuir adequadamente a autoria de um trabalho científico pode ser uma tarefa desafiadora ou constrangedora, sobretudo para pesquisadores iniciantes. Realizar esse julgamento de quais pessoas irão dividir a propriedade intelectual de um paper requer fundamentalmente dois atributos: planejamento e honestidade.

Diferentes áreas do conhecimento usam critérios diferentes para a atribuição da autoria, devido ao uso de metodologias diferentes, compartilhamento de insumos ou infraestrutura, consultoria super-especializada em um software ou técnica, ou controversamente, por tradição de creditar colegas de pesquisa que não atuaram no trabalho.

Na história das ciências existem vários momentos emblemáticos que exemplificam problemas na atribuição da autoria, dentre elas a descoberta da estrutura do DNA. Em 1962, James Watson, Francis Crick, e Maurice Wilkins receberam o Prêmio Nobel de Fisiologia ou Medicina pela determinação da estrutura em dupla hélice do DNA, suprimindo a contribuição da química Rosalind Franklin. 

 

Figura 01: Rosalind Franklin

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Fonte: Wikimedia Commons

#ParaCegoVer: Foto em preto e branco de Rosalind Franklin,uma mulher branca, com olhar direcionado para o horizonte sentada à uma mesa.

 

Como referenciado anteriormente, o processo de atribuição pode estar repleto de tradições e vieses associados, que podem ser reflexos de preconceitos e/ou más condutas dos principais autores. Isso é ilustrado no comportamento de grupos de pesquisa que atribuem autoria indiscriminada a membros, que podem não ter preenchido os critérios de autoria.

Os critérios utilizados no campo das ciências da saúde são definidos desde 1985 pelo ICMJE (International Committee of Medical Journal Editors). Esses critérios, conhecidos como “Requisitos de Uniformidade para Manuscritos Apresentados às Revistas Biomédicas” são revisados pelo comitê temporalmente para garantir o acompanhamento do comportamento da comunidade científica, como o uso de inteligência artificial para a escrita de papers.

São definidos pelo ICMJE 4 critérios mínimos para autoria científica:

  1. Contribuições substanciais para a concepção ou desenho da obra; ou a aquisição, análise ou interpretação de dados para o trabalho; +

  2. Elaborar o texto ou revisá-lo criticamente quanto ao conteúdo intelectual relevante; +

  3. Aprovação final da versão a ser publicada; +

  4. Acordar em ser responsável por todos os aspectos do trabalho, garantindo que questões relacionadas à precisão ou integridade de qualquer parte do trabalho sejam adequadamente investigadas e resolvidas.

 

No entanto, o uso dos critérios não é de fácil aplicação em todas as situações, para isso em 2014 a Comissão de Éticas em Publicação (COPE), organização internacional sem fins lucrativos  formada por editores experientes, elaborou um manual de resolução para os problemas mais comuns, como:

Um pesquisador iniciante realiza grande parte do trabalho básico da pesquisa, mas o supervisor/chefe do departamento escreveu o trabalho e não o incluiu como autor. Embora tenha participado da coleta, apenas coletar dados não é suficiente para atribuir critério de autoria, nessa situação é conveniente que o autor sênior ofereça a oportunidade de o iniciante participar das demais etapas da pesquisa a fim de ser considerado autor do estudo.

É relevante também indicar a diferença entre o reconhecimento da contribuição de um pesquisador e sua autoria, por exemplo: um membro de um grupo de pesquisa ou departamento responsável pelo financiamento do projeto não possui envolvimento o suficiente para autoria. Bem como, estudos que aplicam um conceito ou metodologia descrita especificamente por um autor anteriormente não devem atribuir autoria ao pesquisador responsável pelo estudo que foi usado como base. Nessas situações, periódicos podem abrir a possibilidade de reconhecimento da contribuição no corpo do texto publicado.

Embora os critérios universais preestabelecidos tenham sido uma conquista para a comunidade acadêmica, apenas estipular os critérios de autoria ainda não solucionava o problema de como comunicar no paper quais foram as atribuições de cada autor de forma padronizada e eficiente. Visando solucionar esse problema, em 2015 o CRediT (Taxonomia de Funções de Contribuição) foi criado com o objetivo de reconhecer as contribuições individuais dos autores, diminuir as disputas de autoria e facilitar a colaboração. Essa ideia surgiu após um workshop colaborativo em 2012 liderado pela Universidade Harvard e pela instituição Wellcome Trust, com contribuições de pesquisadores, o Comitê Internacional de Editores de Revistas Médicas (ICMJE) e editoras científicas. Desde então, o modelo do CRediT é a forma mais utilizada para descrever critérios de autoria em revistas das ciências da saúde.  

Outro ponto de confusão para pesquisadores iniciantes é a ordem de autoria do trabalho. Esse critério varia quanto à área do conhecimento e a política editorial da revista que realizará a publicação, sendo utilizado, por exemplo, ordem alfabética do nome dos autores. Entretanto, para as ciências da saúde, sobretudo o campo da Medicina, frequentemente os autores são creditados em ordem de contribuição: o primeiro e segundo autor detêm maior crédito da propriedade intelectual; o último autor é reservado ao pesquisador sênior, desempenhando a função de orientador; demais membros são alocados com base no nível de contribuição ou ordem alfabética.

O domínio do funcionamento de critérios de autoria é um conhecimento muitas vezes pouco debatido em ambientes de pesquisa, sobretudo com pesquisadores iniciantes. A ausência desse debate pode ser um fator de perpetuação de práticas inadequadas de creditação científica, formando pesquisadores enviesados que replicam por assimilação práticas inadequadas quanto a questões de integridade científica.

 

Referências:

BADRELDIN, H. et al. Knowledge and Awareness of Authorship Practices Among Health Science Students: A Cross-Sectional Study. Advances in Medical Education and Practice, v. Volume 12, p. 383–392, abr. 2021.

BRAND, A. et al. Beyond authorship: attribution, contribution, collaboration, and credit. Learned Publishing, v. 28, n. 2, p. 151–155, 1 abr. 2015.

COPE COUNCIL. What constitutes authorship? COPE Discussion Document. 2014. Disponível em: https://publicationethics.org/node/34946. Acesso em: 10 ago. 2023.

INTERNATIONAL COMMITTEE OF MEDICAL JOURNAL EDITORS (ICMJE). Recommendations: Defining the Role of Authors and Contributors. Disponível em: <https://www.icmje.org/recommendations/browse/roles-and-responsibilities/defining-the-role-of-authors-and-contributors.html>.

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